Primeira parte de uma Viagem de Cruzeiro ao Dubai em plena pandemia!
Com arrojo e, vá lá, alguma leviandade, alinhámos numa viagem
de cruzeiro em tempos de acesa pandemia. A digressão decorreu de 3 a 29 de
novembro a partir do embarque no terminal de Cruzeiros de Santa Apolónia (Lisboa)
e o regresso por via aérea de Dubai (Emiratos Árabes Unidos).
O MSC Virtuosa, autêntica cidade flutuante, acolheu somente 1800
passageiros e 450 tripulantes, muito menos de metade da sua total capacidade.
Nos portos onde se efetuaram paragens foram organizadas diversas excursões a
optar pelos passageiros. Como é óbvio, iremos apenas referir aquelas em que
participámos, alertando os leitores para o facto das referências serem
profundamente incompletas e refletirem só o que os olhos do escriba detetaram e
tocaram a sua sensibilidade. Poderão subsistir erros, inexatidões e omissões de
vulto para os quais se pede benevolência.
Barcelona
Navegando pelo
Atlântico português, entrámos no mar de entre duas terras (Mediterrâneo),
avistando de um lado a costa marroquina e do outro, a costa espanhola,
acentuando-se na paisagem aquele enclave rochoso que dá pelo nome de Gibraltar e que é, a nosso ver, uma
aberração territorial por permanecer uma colónia da velha Albion. A primeira
atracagem foi na capital da Catalunha, onde nos esperava uma simpática guia.
No curto tempo disponível, escolhemos a visita ao “Poble Espanyol”, que podemos
traduzir por “Povoado Espanhol”. Trata-se de um espaço cultural onde estão
reproduzidos à escala real, 117 edifícios peculiares das diversas regiões
espanholas (norte, centro, sul e zona mediterrânica). O conjunto foi erigido em
1929, por altura de uma grande exposição internacional e contou com a
colaboração empenhada de exímios arquitetos. A entrada do complexo reproduz a
porta monumental das muralhas de Ávila, a que se sucedem depois outras
edificações relevantes do país vizinho. Devido à pandemia todos os
estabelecimentos estavam fechados e notámos, com certo desagrado, que muitas
praças e pracetas estavam ainda conspurcadas com resíduos do recente “halloween”,
essa absurda festividade introduzida por influência norte-americana para
estímulo consumista de inutilidades. No percurso, avistámos o porto, a estátua
de Colombo a apontar para oriente em vez de ser para o lado das américas, o
Jardim Botânico de Montjuïc, o Museu Joan Miró, os estádios construídos para os
Jogos Olímpicos de 1992, a Torre de Comunicações da autoria de Santiago de
Calatrava, etc., etc.
Marselha
Sem desprimor para um “city-tour” na bela cidade
mediterrânica, optámos pela excursão a Aix-en-provence,
cidade histórica a que se pode aceder facilmente por TGV a partir de Paris.
Havia mercados de rua com muitos transeuntes, bem como um
outro mercado na pequena praça do Hôtel de Ville para produtos alimentícios
frescos. A guia foi-nos dando conta do enorme protagonismo histórico desta
cidade, por onde circularam nomes ilustres como Paul Cézanne e Émile Zola. A
bandeira do município apresenta curiosamente as cores da Catalunha que, em
tempos passados, dominou a região, hoje centro turístico que atrai a burguesia
endinheirada de França e não só. Muito relevante é a arquitetura de casas
senhoriais dos séculos XVII e XVIII que se encontram destinadas a faustosos
hotéis de luxo (Hôtel de Caumont, Hôtel Maurel de Pontevès, Hôtel Boyer d’Eguilles, Hôtel d´Estienne de
St. Jean, entre muitos outros). A cidade é também famosa pela sua
universidade, estância termal, artesanato, igrejas de vários estilos, fruto das
influências ao longo dos séculos.
Uma autêntica moda, quase uma devoção, é a lavanda,
planta aromática, ex-libris da Provença. Ela surge por todo o lado em perfumes,
pomadas, sabonetes, chás, artesanatos, etc.
Génova
Uma ventania gelada acompanhou-nos em todo o percurso
pedestre efetuado nesta importante cidade, potência do comércio marítimo
mediterrânico durante épocas medievais. Nesses tempos, a Itália como estado não
existia. A República de Génova rivalizava com a de Veneza em contendas pouco
amistosas e é a recordação desses tempos que surge agora nesta visita que efetuámos
depois de sairmos do porto que, com as suas rigorosas regras, parece uma cidade
à parte.
Logo à entrada, temos o emblemático farol, conhecido por Lanterna, construído no longínquo
ano de 1128. Depois caminhámos em direção ao centro histórico, observando
exteriormente a Igreja de San Giovanni,
por onde passavam os peregrinos que se dirigiam para Jerusalém, a via Balbi e o
seu Palazzo Reale, a via San Siro, a
majestosa via Garibaldi, a Fonte de Ferrari, a Ópera, a Camera de Commercio, o Palácio Ducal com o seu mercado de
antiguidades, onde vimos um dicionário genovês-italiano, o Palácio da Região da Ligúria, o Bairro de San Lourenzo e a sua grande catedral,
cuja rosácea data do ano de 1400, o Tribunal da Santa Inquisição destinado a
castigar os hereges, o porto antigo, o Museu de Plantas Tropicais Aquáticas, um
dos 100 lavadouros públicos existentes em tempos idos … …
No Café Storico, sito no Largo Alessandro Pertini, saboreámos
uma “focaccia” típica da cidade, incluída no preço do passeio e bebemos um
cafezinho, tão minúsculo que ele era, que nos custou 2 euros.
Civitavecchia
No dia seguinte aportámos a Civitavecchia (Cidade Velha),
importante porto de águas profundas que serve a cidade eterna. Mas não fomos a
Roma nem vimos o Papa que, de resto, aparece todos os dias na televisão e já
não é novidade. Optámos por ir a Turquínia e a Tuscania, cidades históricas da
região do Lázio e da província de Viterbo.
Na Turquínia,
fundada no século IX a. C., encontram-se os maiores vestígios da civilização etrusca
que antecedeu a romana. Diz-se que na respetiva necrópole se acham 6 mil tumbas
funerárias etruscas. A cidade situa-se no cimo de uma colina com 133 metros de
altura, dista 100 km de Roma e foi importante bastião político e espiritual do
Estado Pontifício, chefiado pelo papado durante vários séculos.
Tem como relevantes monumentos as muralhas medievais, a Barriera de San Giusto, Igrejas (Santa Margarida, Santa Maria in Castello
– século XII, San Pancrazio, San Leonardo,
Convento de San Francesco), o Palazzo
Vitelleschi, o Museo Nationale
Etrusco, o Museo de Ceramica di uso a
Corneto, o Museo Nationale
Tarquiniense, o Teatro Comunale e
muitas torres medievais, destinadas não só a exercer vigilância, mas também a
demonstrar o orgulhoso poderio dos nobres seus possuidores (Matila di Canossa, San Spirito, Barucci, Draghi).
Num formoso belvedere junto a um pequeno jardim de altíssimas
tílias, divisa-se a planície com úberes terrenos de semeadura, olivais e vinhas,
o rio Marta, a Reserva Natural das Salinas e ao fundo, a cerca de 7 km, o mar
Tirreno. Acrescente-se que a cidade foi classificada em 2011 Património
Mundial da UNESCO.
Seguimos depois para a Tuscania,
vila medieval amuralhada com 8 mil habitantes. O autocarro estacionou no
exterior das muralhas e seguimos a pé em direção ao centro histórico pela via
Roma, nítida espinha dorsal da povoação. Surge então a Igreja de Santa Maria
Maggiore e a antiquíssima Fontana del
Butinale. Algumas lojas mostravam saquetas de lavanda, lembrando que
estamos na região mais famosa de Itália para o cultivo da apreciada alfazema.
No fim da citada rua está a Torre de Lavello e um parque muito bem cuidado deveras singular. No
Parco Torre di Lavello divisa-se um
belo panorama para o vale do rio Marta e para a colina de San Pietro com a sua famosa basílica. O parque, não sendo muito
extenso, possui curiosas atrações como o arvoredo onde se destaca um robusto Quercus pubescens, designado localmente
por “Rinascita”.
Ao lado da árvore vê-se a “Seme della
Rinascita” que é uma bolota em bronze entalada entre duas rochas Há também
um pequeno anfiteatro e um relógio solar analemático que foi instalado
em 2012. Ele permite conhecer as horas, mas também os meses, a latitude e a longitude
e foi baseado nos estudos dos antigos astrónomos gregos.
Malta
Eis a ilha que, ao longo dos tempos, foi domínio de fenícios,
cartagineses, romanos, árabes, otomanos, Ordem Militar de Malta, franceses,
britânicos… e até portugueses, se nos lembrarmos do Grão-Mestre D. Manuel de
Vilhena que aqui deixou obra e nome. Enveredamos por um passeio de
autocarro que partiu do porto de La Valeta e percorreu toda a ilha. Ficou-nos
na retina o Forte de S. Ângelo, a Catedral de São Paulo, muitos conventos
e igrejas, os dois aprazíveis portos, a encantadora cidade de Mdina,
casas e mais casas, cultivos hortícolas, vinhas, figueiras, oliveiras,
alfarrobeiras, figueiras-da-índia.
Numa rapidíssima paragem em Mdina, só para “verter águas”,
olhámos de relance a entrada do Museu das Masmorras que engloba 2 mil anos da
História de Malta com os seus mistérios e horrores. Gostaríamos de o ter visto.
Acrescente-se que o idioma oficial deste país da União Europeia é o maltês, uma
misturada da língua árabe proveniente do Líbano e da Síria com termos
italianos. Contudo, o ensino do inglês é obrigatório. E pronto, de Malta ficou
só um cheirinho porque o navio tinha que zarpar.
Atenas
Foi também lamentavelmente breve a digressão pedestre pela
capital da Grécia. O Virtuosa ancorou no Pireu, de longe, o porto mais importante do país. A cidade
portuária, fundada no século V a.C., possui vários monumentos e atrações dignas
de ser visitadas com detalhe, entre as quais se contam o Museu Marítimo, o
Museu Arqueológico, o Teatro Comunal e vistosos templos ortodoxos.
Mas a nossa excursão estava destinada a Atenas. Depois de um
demorado compasso de burocrática espera, seguimos de autocarro até ao centro de
Atenas por uma larga avenida de 5 km, ladeada de edifícios públicos e luxuosos
hotéis. Note-se que atualmente as duas cidades estão completamente ligadas,
formando uma Área Metropolitana com cerca de 4 milhões de habitantes.
A nossa guia, de nome Artemísia, foi-nos esclarecendo acerca
dos aspetos curiosos da terra ancestral dos deuses. Foi pena, em meu agnóstico
parecer, terem desistido dessa multiplicidade divina que aglomerava deuses para
todos os gostos e feitios. Explicou depois como apareceu o teatro, só com
atores masculinos, e qual o significado inicial da palavra “hipocrisia”.
Orgulhosamente, referiu que foi em Atenas que se estabeleceu primeiramente a
democracia (um parêntesis para apontar que não era na verdade uma democracia
porque a maioria da população não tinha voto no tocante à governação da “coisa
“pública).
Depois de passarmos perto de uma parte da “riviera grega”,
também chamada Costa de Apolo, chegámos às ruínas do Templo de Zeus,
espaçoso terreno recheado de blocos calcários trabalhados onde se erguem
enormes colunas jónicas. Nada de especial que nos comovesse, para além da
soberba oliveira carregada de grossas azeitonas que se encontrava numa ponta da
estação arqueológica. Divisava-se dali, numa colina, a célebre acrópole,
“ex-libris” da cidade.
Continuando a pé acompanhados da guia que tinha visíveis
dificuldades em caminhar, passámos pela estátua de Lord Byron, pelo Palácio
Zapeion, destinado apenas a receções oficiais, exposições, conferências e
sede da comunidade europeia e pelo Jardim Botânico Nacional, implantado
em 1834 por iniciativa da Rainha Amália, 1ª soberana da Grécia moderna. O jardim
é considerado um pulmão do centro da cidade e consta que possui 7 mil árvores
diferentes. Infelizmente, não deu para ver quase nada. Numa passagem apressada,
registámos apenas a existência de um cipreste muito antigo e altíssimas
palmeiras Washingtonia filifera.
Por fim, alcançámos a praça Zintagma e o Palácio Real, onde funciona o Parlamento,
para assistir ao render da guarda de honra junto ao túmulo do soldado
desconhecido. É um ritual que se repete de 15 em 15 minutos. Dois garbosos
soldados, trajados como manda a tradição e escolhidos criteriosamente por
adequada estatura e esbeltas pernas, marcham com sapatos de madeira de solas
metálicas, produzindo característico ruído “para turista atrair”. De facto, a
praça está permanentemente plena de curiosos visitantes ansiosos por tudo
fotografar.
Artemísia deu-nos conta do significado dos diversos símbolos que ornamentam o palácio, não se esquecendo de informar que os turcos otomanos mandaram aqui durante 4 séculos e deixaram resquícios.
Continua no próximo domingo!
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