Dá-me mais gozo lê-las na língua
original (francês) mas elas estão traduzidas em muitos idiomas e há mesmo, pelo
menos uma das aventuras, redigida em esperanto. No “Les lauriers de César”, o
nosso herói ficou encarregado de ir a Roma surripiar a coroa de louros do
imperador para perfumar um “ragoût”, ou seja, um atrativo guisado, confecionado
na aldeia dos irredutíveis gauleses. Chega! Não é agora o momento de contar as
peripécias da saborosa história.
O Laurus nobilis, arbusto (ou árvore) perene da família das Lauraceae é típico da região mediterrânica,
mas chegou a povoar densas florestas em todo o continente europeu antes do
arrefecimento global que se verificou há umas dezenas de milhares de anos. Os
loureiros de crescimento espontâneo que ocorrem na cordilheira da Arrábida
constituem uma relíquia desses tempos primitivos.
O fascínio pelo loureiro remonta
a recuadas eras. Envolvida em mistérios, superstições e premonições esta
laurácea tem acentuado relevo nos livros “Plantas Mágicas e Botânica Oculta” de
Sédir e de Paracelso. Na Grécia, a árvore era consagrada a Apolo e integrava
uma curiosa forma de magia adivinhatória chamada dafnomancia, a qual tinha a
ver com a mastigação de folhas tenras praticada pelas pitonisas e sibilas e
também pela interpretação do crepitar e da fumaça ocasionados no cerimonial da
queima das ramagens. O volumoso “Diccionario de Plantas Curativas de la
Península Ibérica” de Enric Balasch e Yolanda Ruíz dedica todo um capítulo à
botânica oculta e à mitologia clássica do “laurel común”.
Sendo uma planta ornamental de
folhas brilhantes enraizou-se o costume de coroar os heróis vencedores das
batalhas ou das pugnas desportivas com folhas de louro. Esta tradição que se
iniciou na antiga Grécia, transitou depois para o império romano e daí para
todo o mundo significando sucesso. Várias línguas neolatinas incluíram
no seu vocabulário corrente palavras como laureado ou bacharel
(do latim baccalaureatus).
A planta é dióica, o que
significa que as flores masculinas e as femininas estão em pés separados.
Propaga-se com facilidade, quer por semente, quer por estacaria, dá-se bem em
quaisquer solos, suporta razoavelmente as podas e só não gosta de geadas. As
suas folhas são glabras, coriáceas, brilhantes, aromáticas, alternas e
lanceoladas. As flores são amareladas com cerca de 1 cm de diâmetro. Depois de
polinizadas geram uma baga que, quando madura, é negra e reluzente, semelhante
às azeitonas pelo tamanho e pela cor. O tronco é direito, tem casca
acinzentada, formando com as ramagens uma copa densa.
As folhas do louro contêm
provitamina A, vitaminas C, D e do complexo B, ferro, cálcio, potássio,
magnésio, fósforo, tanino, óleo essencial, mas também alguns alcaloides que, em
excesso, podem ser tóxicos. São conhecidas as suas propriedades como antissépticas,
anti-inflamatórias, estimulantes, antibacterianas, sedativas e sudoríficas. Os frutos
possuem até 30% de ácidos gordos.
Plínio, o Velho, já indicava o
louro para paralisia, espasmos, ciática, dores de cabeça, catarros, infeções do
aparelho auditivo e reumatismo.
Investigações modernas referem os
seus benéficos efeitos em diabetes tipo 2 e colesterol, já que reduz os níveis
da glicose e diminui os triglicéridos do sangue e ainda em artrites, problemas
respiratórios, doenças cardiovasculares, envelhecimento precoce e cancro porque
restringe o crescimento das células cancerígenas.
A “Science Alert”, via internet,
recomenda o seguinte “chá”: Deitar uma chávena de água fervente sobre 3 g de
folhas de louro. Deixar em repouso de 10 a 15 minutos. Beber em jejum
diariamente mas interromper por uma semana ao fim de 20 dias.
O óleo extraído das bagas negras
que em pasta se chama “manteiga de loureiro” abranda, através de fricções, as
dores musculares de pessoas e animais. Entra também em formulações
dermatológicas para debelar micoses, psoríase e pediculose.
Na cozinha dos países
mediterrânicos as folhas de louro são omnipresentes na aromatização de guisados
e refogados. Essa prática condimentar alastrou já à gastronomia de todo o mundo
e há mesmo quem seque e pulverize as folhas para as integrar nos cozinhados. Consta-se
que os beduínos do norte de África utilizam as mesmas folhas para reforçar o
paladar do café.
O loureiro é muito adequado para
a topiária, ou seja a arte de fazer esculturas vegetais. É também ideal para a
formação de sebes na divisão de propriedades com a vantagem do seu odor repelir
os insetos predadores.
A madeira do loureiro é duríssima
e pode ser utilizada nos trabalhos de entalhar em marcenaria.
O famoso sabão de Alepo (cidade
síria totalmente destroçada pela infame guerra) era tradicionalmente fabricado
com óleo das “azeitonas” do loureiro.
Há ainda que aludir aos grelhados
madeirenses em pau de louro que, dizem os entendidos, dá um gosto especial à
carne. Todavia, esses paus de louro provêm duma variedade afim, o Laurus azorica, endémica da região
macaronésica (Açores, Madeira e Canárias).
Devo igualmente referenciar
outras espécies abundantes em Portugal, como o loureiro-rosa (Nerium oleander) e o loureiro-cerejo (Prunus laurocerasus), altamente
venenosas. É preciso não as confundir porque as folhas são parecidas com as do Laurus nobilis, mas o odor que emanam é
bem diferente. Cuidado pois!
Finalmente, acentuo que as folhas
de louro devem ser usadas com moderação, a sua ingestão em quantidade é tóxica
e podem causar dermatites de contacto em pessoas mais sensíveis.
Miguel Boieiro
(texto da autoria de Miguel Boieiro, Vice-presidente da Direção da SPN)
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