quarta-feira, 28 de junho de 2023

As tradições dos Santos Populares


Junho é o mês dos Santos Populares em Portugal. São muitas as localidades portuguesas que festejam com pompa as noites de Santo António, São João e São Pedro.


Desta vez, vamos fazer uma pequena viagem à origem destas datas e às tradições associadas a estas noites de arraiais e folia.

13, 24 e 29, porquê?

Santo António, de seu nome de nascença Fernando de Bulhões, nasceu em Lisboa algures entre 1191 e 1195. De uma família nobre, acabaria por tornar-se religioso e foi viver para Itália.

Faleceu perto de Pádua, a 13 de junho de 1231. Este passou a ser o dia dele. Festejamos no dia da sua morte, curioso não?

São João Batista, primo de Jesus, terá nascido a 24 de junho no século I antes de Cristo (segundo os historiadores religiosos). Aqui festejamos a natividade, pois a data de falecimento aponta para 29 de agosto. O dia 24 está também associado ao solstício de verão, comemorado neste dia, durante a Idade Média.

São Pedro, o primeiro Papa da Igreja Católica vê a sua comemoração a 29 de junho a partir do século III ou IV e partilha este dia com São Paulo. Esta data foi associada a uma celebração pagã dedicada a Rómulo e Remo, pais da cidade de Roma.

Santos por todo o mundo!

São vários os países que comemoram estas datas, pois foram adotadas por diversas religiões cristãs. No hemisfério norte, são muitos os países a associar estas datas à chegada do verão, sobretudo nos países escandinavos onde a celebração da luz solar tem enorme importância. Na Finlândia, temos o Juhannus, na Dinamarca o Hans e na Noruega o Jonsok.

Os nossos irmãos brasileiros, comemoram em grande festa o São João e o São Pedro, apelidando estas festas no seu conjunto de “Festas Juninas”.

Sardinhas

Os cardumes de sardinhas estão no seu auge entre maio e outubro. Elas formam cardumes enormes, e nesta altura as águas superficiais são mais quentes e o plâncton de que elas se alimentam é mais abundante, daí elas serem gordinhas e o ómega 3 pingar nas brasas e no pão. Em 1936, no livro Culinária Portuguesa, escrito por Olleboma, já se fazia a referência ao consumo deste peixe no Santo António e poucos anos mais tarde, seria adotado nas festas do São João.

Temos assistido à perda de qualidade da sardinha, pois cada vez mais ela só se torna saborosa lá para os meados de julho e durante o mês de agosto. Culpa das alterações climáticas? Quiçá!

Manjerico, alho-porro, martelo e balões 

O manjerico também designado de “erva dos namorados”, era oferecido pelos rapazes às suas namoradas na noite de Santo António. Noutros pontos do país, na noite de São João e sobretudo nas aldeias, os rapazes iam roubar vasos de flores às casas das raparigas e colocavam-nos no adro da igreja. Na manhã seguinte, a azáfama instalava-se para descobrir de quem eram os vasos e quem os teria “roubado”.

O alho-porro selvagem e em flor, era apanhado durante a noite, por grupos de pessoas que se iam movimentando pelas ruas do Porto em meados do século XIX. A finalidade inicial, consistia em guardar o alho-porro atrás da porta de casa, para afastar aos maus espíritos durante o ano seguinte. Foi sendo usado pelos rapazes para estabelecerem contacto com as raparigas durante as rusgas noturnas (ajudavam no flirt, estão a ver?).

Não se sabe muito bem como chegámos aos martelos. Mais barulhentos e estridentes, servem para bater na cabeça dos foliões, e acordá-los para o verão depois de um inverno sombrio e tristonho. Há mais de 20 anos fui pela primeira vez ao São João do Porto e levei marteladas toda a noite. E não vale a pena bufar, porque levamos mais ainda! É preciso entrar no espírito.

Também levei com o alho-porro no nariz, para sentir bem o odor.

Seria importante manter a tradição do alho-porro e abandonar a dos martelinhos, bem menos sustentável.

Os balões de São João são um culto pagão de celebração do sol e da luz do verão. Esta tradição foi sendo restringida, uma vez que a queda destes balões provocou incêndios.

A fogueira de São João

A fogueira simboliza o nascimento de São João. Isabel, mãe de João Batista terá acendido uma fogueira para avisar Maria, mãe de Jesus, do feliz acontecimento. Há várias tradições associadas à fogueira hoje em dia, como a celebração da luz e da colheita do milho e a adivinhação de possíveis pares de namorados e consequentemente casamentos. Mas uma das que melhor se conhece é aquela que diz que quem saltar a fogueira, em número ímpar de saltos e no mínimo três vezes, fica por todo o ano protegido de todos os males. É um bom amuleto, desde que sejamos ágeis e tenhamos uma boa condição física!

Marchas e casamentos

As marchas envolvem um trabalho de meses de centenas de pessoas, que ensaiam coreografias, entoam canções originais, costuram figurinos deslumbrantes e constroem arcos coloridos. As marchas existem em todo o país, mas as mais representativas são as de Lisboa, no Santo António, padroeiro da cidade. No início, antes dos anos 30, existiam as ranchadas – marchas de cada bairro. Foi em 1932, que se organizou a primeira competição de marchas populares, sob a produção do cineasta Leitão de Barros, tendo o desfile acontecido no Parque Mayer. Hoje o espetáculo decorre pela Avenida da Liberdade e atrai muitos foliões, curiosos e turistas.

Santo António é também conhecido como santo casamenteiro. Em 1958, numa iniciativa promovida pelo jornal Diário de Notícias, 36 casais uniram-se pelo matrimónio na Igreja de Santo António, num evento que se repetiu durante 16 anos consecutivos. O objetivo desta iniciativa era possibilitar o casamento a jovens casais com dificuldades financeiras.

Interrompidos em 1974 e retomados 30 depois pela Câmara Municipal de Lisboa, os casamentos de Santo António passaram a celebrar-se na Sé de Lisboa e no Salão Nobre dos Paços do Concelho, numa cerimónia preparada ao detalhe e com destaque televisivo relevante.

Arraiais

Pouco se sabe sobre a origem dos arraiais, mas é fácil perceber que onde há portugueses, comida e alegria tem de existir música e dança até de madrugada.

Provavelmente existirão muitos detalhes em falta neste artigo, mas também não é fácil perceber a origem de festividades que mistura ao longo dos tempos, cultura pagã e religiosa. O importante é que estas culturas persistam, e que possam ser sempre motivo encontros, riso, convívio a amizade.


(texto da autoria de Sandrina Martins)


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